Túnel do Tempo.

 

Este espaço do Garopaba Jornal é para matérias especiais que tenham relação com o passado. Nesta primeira edição estamos abordando os Sambaquis. Legado milenar deixado pelos antepassados em nossa Terra. Outra matéria especial é com o Kauli, uma entrevista que fiz, quando ele ganhou o tricampeonato mundial de Wind Surfe. Boa leitura.

Sambaquis.

 

O que são?

 

São montanhas de conchas construídas pela mão humana, há milhares de anos atrás. Normalmente com a mistura de areia, conchas, restos de caças e de pesca. E sepultamentos humanos ritualísticos (enterravam seus mortos ali, sempre respeitando um ritual próprio). Em alguns sambaquis podem se encontrar estruturas de pedras (piscinas naturais, marcos e observatórios astronômicos ou oficinas líticas, como no sambaqui da Ferrugem).

A palavra é originária do tupi-guarani e significa montanha de conchas.

 

Onde estão?

 

No mundo todo. Tem sambaqui no litoral do Japão, na Escócia, na Dinamarca, nos EUA, no Golfo do México, no Caribe, no Peru, no Brasil e em outros lugares. Em inglês se chamam Montain Shells, em espanhol: Cerritos, em dinamarquês nem vale a pena escrever, você não vai conseguir pronunciar mesmo...

 

Muitos pesquisadores pensam que eles são a idéia prática que surgiu ao mesmo tempo em lugares diferentes do globo, outros anseiam pela pesquisa de DNA para dar uma resposta melhor embasada.

Os maiores sambaquis do mundo estão no litoral sul de Santa Catarina.(É nóis!) O de Garopaba do Sul na cidade de Jaguaruna, considerado o maior do Planeta já teve 30 metros de altura. Entre Florianópolis e Jaguaruna foi encontrada a maior concentração de sambaquis do mundo ( é nóis de novo!).

Há quanto tempo foram feitos?

O sambaqui mais antigo já datado em terra brasileiras foi o de Capelinha, no litoral de São Paulo, cerca de 9.000 anos de idade. Detalhe: ele é subaquático ou seja está embaixo da água do mar. Provavelmente o mar estava mais recuado há milhares de anos atrás. No litoral sul de Santa Catarina os mais antigos foram os de Jaguaruna, cerca de 7.800 anos atrás. Mas as pesquisas não terminaram e nem todos foram datados, então podem aparecer outros, mais velhos ou não.

                                                                                                              

Qual a importância deles?

 

Todas as importâncias possíveis, já que a arqueologia está reescrevendo a história do mundo. Primeiro são fontes de informações preciosas de um passado que não suspeitávamos. Estudos recentes revelam que sua sociedade era bem estruturada com especialistas nas funções (canoeiros, artesãos, caçadores, etc...) e talvez muito avançados para época (se ficar provado que a escrita presente nas pedras do litoral catarinense for deles).

Resumindo: Eles são fonte de estudos para muitas Universidades hoje, são fonte de conhecimento de um povo que habitou a Terra por milênios e podem vir a ser uma fonte de renda com o turismo cultural na região e por causa deles áreas belíssimas estão preservadas e outras ainda podem vir a ser.

 

Os Sambaquis de Garopaba

 

Existem Sambaquis no mundo todo, mas o da Praia da Ferrugem em Garopaba é bem diferente dos outros, talvez o mais completo. Outro Sambaqui encontrado recentemente, por Keler Lucas, está na Palhocinha.

 

O que tem no Sambaqui da Ferrugem?

 

Oficinas líticas: Sabe aquelas marcas nas pedras negras que parecem “unhadas de dinossauro e pratos de índios”, como diziam os antigos? Pois bem, ali os sambaquianos faziam suas peças de pedra, desgastando uma pedra na outra, saiam facas, flechas, baleias, golfinhos e utensílios práticos para o dia a dia (veja as fotos abaixo).

 

Marcos Astronômicos: Lá existem pedras que foram colocadas para marcar o primeiro dia do inverno e do verão (Solstícios), datas importantes até hoje para sobrevivência humana (determinam o clima, quente ou frio, que virá, estação de frutas e peixes, etc...)

 

Piscinas Naturais: Duas piscinas de água doce, garantem conforto nos dias quentes e água para desgastar as pedras e fazer os utensílios nas Oficinas Líticas.

 

Fonte de Água Doce: No alto do monte, uma rara fonte de água doce próxima ao mar, ofertava a sobrevivência sem maiores esforços.

 

Entre Lagoa e Mar: Duas praias e uma lagoa forneciam peixes e moluscos para a alimentação. Como eram excelentes canoeiros e usavam esse meio de transporte como você usa o carro hoje, o mar e a lagoa eram as “estradas” por onde eles se deslocavam.

 

Corpos: Como quase todos os Sambaquis do mundo, os sepultamentos ritualísticos de pessoas que viveram a milhares de anos nesse paraíso, quando a oferta de peixes, camarões eram enormes e as baleias se juntavam aos montes na frente da praia. Testemunhas de um tempo único, que não volta mais. São esses ossos que com a tecnologia atual (e a que ainda virá) poderão desvendar muitas das informações que hoje não sabemos sobre suas vidas. Alguns corpos já se perderam levados por curiosos ou ainda pisoteados nas trilhas.

 

Utensílios: Muitas das peças feitas nas oficinas líticas estavam enterradas no parte de terra do monte. Mas o turismo predatório ( única política de turismo realizada nos últimos anos) e a não proteção do lugar, fez com que milhares de pessoas depredassem e levassem peças que hoje adornariam um museu na cidade. Do que restou nas casas das pessoas há pouco caso dos governantes em preservar isso. Pena, pois o turismo cultural movimenta bilhões por ano.Peças de pedra feitas nas Oficinas Líticas.

Piscina Natural dentro do Sambaqui da Ferrugem. Foto de Moisés João Lopes.

Oficina Lítica Circular. Aqui eram desgastadsa as pedras com formato mais circular tipo boleadeiras, baleias, etc...

As incrições nas Pedras de Garopaba. Mistérios e maravilhas.

Mistérios e maravilhas da tecnologia Milenar.

 

Pouca gente conhece e quase ninguém lhes dá o valor que têm. Quem vê as inscrições gravadas (arte rupestre ou Petróglifos), na maioria das vezes em pedras negras e em baixo relevo, não imagina que está diante de uma maravilha de todos os tempos e de um mistério, aparentemente sem solução.

 

Maravilha.

 

Um tipo de escrita, provavelmente, espalhada por 200 km do litoral catarinense, com símbolos que se repetem. Ora desenhos geométricos, ora formas de animais, peixes, homens, pássaros.

Impossível, para a tecnologia atual, saber quando foram feitas, mas temos pistas de sua antiguidade. 4.500 anos atrás caiu um resto orgânico (possível de datar) dentro de uma inscrição que já estava feita, então aquela inscrição é mais velha que isso, mas quanto mais velha não sabemos (mistério 1).

 

Outros restos orgânicos encontrados em outras inscrições forma datados de 2.500 anos, 2 mil anos... Estamos falando de um tipo de escrita, milenar, catarinense, não decifrada?

 

Maravilha: As possibilidades de estudos são enormes, podendo gerar um tipo de turismo para todas as temporadas: o turismo de estudos científicos. Além desse, o turismo histórico, de mistérios e curiosidade também podem render durante todo o ano.

 

Mistério 2: Como não podemos datar, não podemos saber quem fez  (ou que povo, foi o autor) muita gente acredita que os sambaquianos ( os construtores dos sambaquis) tenham feito, já que viviam aqui desde 7.800 anos, mas não podemos afirmar isso. Quem realmente foi o autor é mais um mistério.

 

Some e desaparece conforme a posição do Sol. Mistério?

 

Parece mentira, mas é verdade o terceiro mistério das inscrições. Keler Lucas é o fotógrafo e pesquisador que dedicou sua vida aos estudos das inscrições. Percebeu que havia dia em que elas estavam mais bonitas e dias que desapareciam. Foi ele que percebeu que nas datas importantes (Solstícios e equinócios que marcam o início das estações do ano) algumas delas apareciam mais. pronto, estava aberto a observação de Keler para o fenômeno. Décadas depois ele já previa quando determinado painel estaria bom para fotografar.

 

O mistério aqui é saber que tecnologia é essa que joga com luz e sombra em cima de pequenos furos feitos nas pedras, que faz parecer mágica? Devia saber muito de luz do Sol e pedra quem fez isso.

 

Próximo a Cabeça de Pedra, há um painel de arte rupestre (ou Petróglifos)  na Praia da Silveira que muda no próprio dia, começa com uns símbolos pela manhã e vai trocando conforme o Sol se move e chega ao final da tarde sem alguns símbolos que iniciaram e com outros que não estavam lá pela manhã.

 

Quem passa pelos símbolos em dias e horários em que não está favorável a luz do Sol, acha os símbolos sem graça, mas já quem sabe os dias ou dá sorte terá um espetáculo  garantido. A emoção de estar de frente para milênios de história misteriosa é impagável.

 

O Grande Problema.

 

As inscrições estão sumindo. Seja por vandalismo (tem idiota que coloca o nome em cima, como na foto que ilustra essa reportagem), seja por desconhecimento ou por descaso. Os políticos da cidade até fazem discursos falando no patrimônio arqueológico, mas até hoje, só discurso, quando tiveram que atuar na área foi decepcionante. Nunca fizeram nada que proteja e valorize o patrimônio deixado pelos antepassados, que poderia gerar turismo de ano todo para a cidade.

 

Outro problema é que o povo da cidade nem imagina o patrimônio da humanidade que está ali nas pedras da cidade e nas ilhas em volta. O maior painel de arte rupestre de todo Oceano Atlântico Sul, está na Ilha do Coral. Isso eu li num livro de um Alemão, por que aqui, a exceção de algumas poucas pessoas, o resto não faz ideia do presente que a rica história do local lhe deu. Então sem a força popular e empresarial essa preservação não acontece e esse turismo não desenvolve.

Existe um pré-projeto de Museu ao Céu Aberto, desenvolvido por Keler, que serviria de atração principal e apelo para a visitação da cidade.

 

Agora pelo menos você já sabe, aumentou um pouco a chance de preservação dessas maravilhas e mistérios da nossa região.

A Cabeça de Pedra. Feita pelo Homem ou pela Natureza?

Feita pelo Homem ou pela Natureza?

 

Em torno de 200 mil reais custa a resposta dessa pergunta. Para saber se houve intervenção humana com tecnologia que conhecemos precisamos de um estudo de pátina que não é feito no Brasil, só nos EUA e custa algo entre U$ 100 mil ( cem mil dólares).

 

Não conheço ninguém com disposição para pagar este custo. É possível para governos e Universidades dispor de uma quantia dessas para um estudo, mas teríamos que gerar uma curiosidade fora do normal para investirem nisso.

 

Então a solução, enquanto o estudo não vem, é cada um utilizar seus aparelhos de pesquisa: o olho, a intuição, as informações e o raciocínio. Há bons argumentos para todos os lados.

 

É feita pelo Homem, dizem alguns:

 

É possível e nem tão difícil assim. Basta um homem talentoso e com conhecimento de pedra (isso os povos antigos daqui e de todas as Américas tinham de sobra) e um pedaço de pedra triangular (cunha) e outro retangular (martelo) e depois de feitas as linhas preliminares (como as que aparecem nas “rugas” da testa até hoje) era só bater com a cunha nos buracos abertos até deslocar os blocos de pedra que formam o olho por exemplo, depois repete-se a operação com outro olho e com a parte abaixo do nariz. Está pronto.

 

É feita pela Natureza, afirmam outros:

 

Sim, é possível, a natureza é capaz de qualquer coisa e formato. Já vimos árvores que parecem mulheres, pedras que lembram tantas coisas, essa seria apenas mais uma. Na região existem dezenas de cabeças de pedra, como essa, sempre estão próximas a sítios arqueológicos (próximo da cabeça está a maior quantidade de símbolos milenares, ou petróglifos, encontrados na região).

 

Para os Incas não Importava quem fez.

 

O Peabiru é um antigo caminho (cerca de 5 mil anos) usado por diversos povos da América do Sul, inclusive os Incas, e vinha até está região. Para esse povo que fazia Pirâmides de Pedra no atual Peru uma Huaca era uma cabeça de Pedra sagrada. Não importa se feita por um artista, sacerdote ou Natureza. O fato de uma pedra assumir feições humanas já a tornava sagrada.

 

E nós?

 

Nossa civilização cultua o dinheiro (muitas vezes acima de qualquer Deus). Mas podemos fazer um mistura de passado, presente e futuro. Sagrada, a cabeça de pedra do passado, chega ao presente intrigando, gerando curiosidade e turismo (dinheiro). E chegará ao futuro trazendo as respostas dos mistérios que a envolvem. Outra possibilidade é fazer o que já temos feito nesses anos desde que ela foi descoberta por Keler Lucas: Nada. Descaso, essa ação já praticamos bastante aos tesouros escondidos de nossa região.